Busca Matéria:



segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Entrevista: Letícia Helena

A entrevistada da vez no Canal 17 é a jornalista carioca Letícia Helena, que acaba de dar uma guinada na carreira, saindo da redação de O Globo, onde trabalha há 20 anos, para atuar na área de marketing do jornal. Editora desde 2006 dos suplementos Zona Sul e Ilha do Governador, Letícia tem como novo desafio coordenar os produtos dos Jornais de Bairro.

Em seu currículo, consta um estágio na assessoria de imprensa da antiga Cerj (hoje Ampla) e na Rádio Fluminense, a Maldita. Mas logo ela viria a ingressar em O Globo, onde atuou nos jornais de Bairro e nas editorias Rio, Nacional, Política e Comportamento. Letícia também teve uma passagem rápida pelas redações da Revista Isto É e do Jornal do Brasil, onde foi editora-adjunta de Brasil.

Depois de entrevistar algumas pessoas que atuam nas áreas de marketing e comunicação, achei que seria o momento de conversar com um jornalista de redação, que nos falasse um pouco sobre o dia-a-dia do jornalismo (para quem não conhece) e o relacionamento com as assessorias de imprensa. Na verdade, eu nem sabia ainda que a nossa entrevistada já havia sido abduzida pelo marketing. Mas, seja como for, o bate-papo com ela vai ser sempre bom. Vambora conferir:

Canal 17: O que foi determinante na escolha pelo Jornalismo?

Letícia Helena: Não saberia responder com precisão, mas me lembro de ficar fascinada com as reportagens da Sandra Passarinho no Fantástico. Curiosamente, apesar da inspiração televisiva, nunca me passou pela cabeça ser repórter de TV. Nasci no Rio, em 1960. Estudei no interior do Estado (Resende), mas desde muito pequena já dizia que queria ser jornalista. Adorava escrever na escola.

Canal 17: Em sua opinião, quais são as principais características e interesses que deve ter um jovem que queira fazer jornalismo? Hoje, não haveria uma procura exagerada pela faculdade de comunicação, talvez por conta de uma certa busca nascisista de muitos por aparecer na TV?

Letícia Helena: A característica fundamental, para mim, é ser curioso. E isso vale tanto para a busca de informações nos meios tradicionais (TV, internet, revista, livros e etc..) como para ter curiosidade com a vida em geral. Tipo ver um aglomerado na rua e querer saber do que se trata - ou entrar num restaurante novo e ler todo o cardápio. E concordo com essa teoria da busca narcisista: para o bem e para o mal, o jornalismo tem, sim, uma aura de glamour que poucas profissões conseguem. Mas não é o tempo todo assim.

Canal 17: A faculdade de Jornalismo atendeu suas expectativas ou, no final das contas, o maior aprendizado vem mesmo com a prática?

Letícia Helena: Fiz faculdade num período de pós-democratização do país, em que a agitação política contava mais do que os estudos em si. Como experiência, lógico que foi ótimo. Para o aprendizado, o cotidiano de trabalho foi muito melhor.

Canal 17: Quais foram as matérias e reportagens mais difíceis e gratificantes da sua carreira?

Letícia Helena: Eu podia escrever um testamento... Mas adorei ter sido a única repórter do mundo (risos) a fazer uma exclusiva com o Dalai Lama, durante a Rio-92. Também fiz a primeira reportagem sobre mulheres envolvidas com o tráfico - ainda em 1990. Acompanhei o movimento dos caras-pintadas, as campanhas do Lula, 20 carnavais no Sambódromo e muitos etc... Mas poderia destacar uma reportagem com a qual concorri ao Líbero Badáro, em 1990, sobre os filhos da rua. Mostrava gente que tinha sido criada nas ruas e que ali casava e tinha filhos, que também viviam sem teto. Foi a única reportagem daquele ano, no prêmio, que não tratava de um escândalo do governo Collor.

Canal 17: Em sua opinião, o nível do Jornalismo diário brasileiro (estou falando aqui dos jornais mais tradicionais) tem se mantido nas últimas décadas ou estaria havendo uma queda de qualidade no processo de produção e checagem de informações? As novas gerações têm reciclado de forma satisfatória as redações em termos de qualidade de texto e de bagagem cultural?

Letícia Helena: Olha, ainda não consegui chegar a uma conclusão a respeito. Quando comecei no jornalismo, você ainda via muita gente em redação sem formação superior, mas, de modo geral, as pessoas eram mais cultas. Tinham lido na adolescência. Hoje, creio que a internet faz com quem a garotada ache que saber o nome da banda da moda é cultura - e não é. E sinto nos mais jovens uma certa vergonha - inexplicável, é claro - em conhecer coisas antigas.

Canal 17: O que você gosta de ler, nas horas vagas? Aliás, quais são seus hobbies e interesses, fora o trabalho?

Letícia Helena: Gosto de ler - e sempre gostei, diga-se de passagem - de bula de remédio a qualquer livro que me caia nas mãos. Por exemplo: adoro Harry Potter, mas o último livro que me emocionou foi o Caçador de Pipas. Acho que a leitura variada é um instrumento valioso, porque você entende que existem mil formas de dizer a mesma coisa - e todas podem ser muito atraentes, quando bem-feitas. De resto, ocupo meu tempo livre cuidando do meu filho de 5 anos.

Canal 17: Voltando a conversa um pouco para a relação com as assessorias de imprensa: você recebe muitos releases por dia? Quais seriam as três características vitais e básicas de um bom release ou sugestão de pauta? Tem muitos e bons contatos com as assessorias de imprensa? Há diferenças entre as assessorias do Rio e de SP?

Letícia Helena: Quando era editora do Jornal de Bairros recebia dezenas de releases por dia e lia todos. Acho que release precisa ter três coisas básicas: ser curto, direto e em bom português. Ele deve instigar a curiosidade de cada um em querer saber mais - e aí a assessoria marca o gol de chamar a atenção do jornalista. Tenho ótimos contatos em assessorias e não vejo muita diferença nas empresas do Rio para as de SP.

Canal 17: Em sua opinião, qual é a importância das (boas) assessorias de imprensa no processo de produção das informações que chegam até os leitores?

Letícia Helena: A assessoria pode - e deve - ser um facilitador do jornalista, já que permite que você tenha acesso a quem precisa e que pode não querer falar com você por não te conhecer. O lado negativo é que ela estimula a preguiça do jornalista que se acostuma a ter tudo mastigado e não vai à luta pela informação.

Canal 17: O que te irrita às vezes no contato ou na abordagem dos assessores de imprensa?

Letícia Helena: O que mais me irrita é a insistência. Embora entenda a ansiedade do assessor - motivada, muitas vezes, pelo fato de os jornalistas não responderem e-mails ou retornarem ligações - acho que ficar fazendo follow é uma chatice.

Canal 17: Fazendo um breve exercício de futurologia, como você vê o jornalismo daqui a uns cinco anos? Você acha que o jornalismo online vai ganhar ainda mais espaço e importância junto ao público em geral, principalmente com a entrada em cena das novas gerações que nasceram com uma mão na mamadeira e a outra no mouse?

Letícia Helena: Acho a internet importante sim, mas o desafio do jornalismo online é criar no cidadão o hábito de ler notícias no computador - e não ficar vagando no cyberespaço irregularmente. Não gosto dessa idéia da futurologia. Quando aconteceu a bolha da internet, as pessoas apostavam que os jornais de papel iam para o buraco. Não foram...

Nenhum comentário: