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sábado, 23 de fevereiro de 2008

Os sonhos de cada um...

Ontem, de novo no Aeroporto de Congonhas, voltando pro Rio, conheci, por conta de mais um atraso em um vôo da Gol rumo ao Galeão, um sujeito bacana, inteligente e bem-humorado, com quem fiquei conversando sobre a decadência sócio-econômica do Rio, dentre outros assuntos correlacionados.

Ele também já morou alguns anos em São Paulo e quase toda semana vai pra lá, que nem eu. E tem a mesma visão: enquanto São Paulo, com todos os seus problemas de uma grande metrópole de terceiro mundo, deixa na gente uma impressão de prosperidade, de oportunidade e de valorização do trabalho e do empreendedorismo, no Rio a gente fica, cada vez mais, com aquela sensação de que o poço não tem mais fundo.

E por que estou balangando sobre isso? Porque a conversa acabou se deslocando para um outro ponto: as diferenças que nós dois, meio que “cidadãos das duas cidades”, percebemos entre os sonhos e projetos de futuro dos jovens e dos não tão jovens assim em São Paulo e no Rio. Da mesma forma que eu, ele conhece um bocado de gente no Rio que ou tem um negócio baseado no “paitrocínio” ou sonha em passar em um concurso público...

Ele me falou do namorado da dentista dele que, com 31 anos, depois de trabalhar por dois anos em um escritório e não dar certo, porque “ralava muito e não ganhava o que, segundo ele, seria justo”, está tentando pela terceira vez passar em um concurso na área de Direito (enquanto isso, é bancado pelos pais e indiretamente pela namorada...). Sonho do cabra: ter um emprego “garantido”, ter a “estabilidade” que só o emprego público assegura...

Infelizmente, no Rio, além de uma grande parcela da população que vive às custas dos governos (municipal, estadual e federal), na ativa ou como aposentados (sendo que uma parte deles com salários de “marajás”), temos milhares de jovens jovens ou de jovens balzacos que vivem obcecados pela idéia de passar num concurso público e “ter um emprego e um salário garantido pelo resto da vida”... Isso em 2008!

E esse meu amigo de aeroporto e de reclamações no balcão da Gol contra o atraso no vôo me disse que não descarta a possibilidade de voltar a morar em São Paulo por causa dos filhos, que teriam muito mais oportunidades profissionais e de sucesso em iniciativas empreendedoras. E ele ama o Rio, adora morar, viver e acordar na cidade, como eu. E sofre todo dia com essas amargas percepções e decepções.

Ficamos, antes da chamada para o embarque, conversando sobre histórias de várias pessoas que conhecíamos em São Paulo que “vieram de baixo”, que moravam em bairros bem pobres, mas que, com sonho, estudo (graduação e pós-graduação pagas com o próprio bolso), determinação, talento e muita dedicação ao trabalho, hoje estão super bem de vida, em empresas privadas ou em negócios próprios.

Eu poderia ficar despejando um milhão de linhas sobre minhas experiências profissionais no Rio e em São Paulo (onde acho que um ano de trabalho, pelo menos nas áreas de marketing e de comunicação, equivale, em termos de aprendizagem e de estímulos, a cinco anos no Rio).

Poderia falar que em São Paulo existe um capitalismo que oferece muito mais oportunidades, com todas as contradições inerentes ao capitalismo... E que no Rio ainda estamos num estágio meio feudal, um certo pré-capitalismo não inclusivo, que nos deixa uma sensação de que aqui só existe funcionário público ou prestadores de serviço das estatais...

Mas a idéia deste post não é essa, e, pra falar a verdade, acho que a vocação do Rio não é ser igual a SP (a cidade, se fosse bem administrada, poderia ser um pólo bem mais desenvolvido de turismo, entretenimento, cinema, vídeo, artes em geral, cultura, esportes, serviços e negócios na área de tecnologia da informação...). A idéia aqui é falar de sonhos, de projetos. Não só de sonhos individuais, de carreira, de sucesso, de grana, mas, se ainda for possível, de sonhos “coletivos”.

O que você quer para a sua vida? Antes de pensar na sua carreira, no seu concurso (se isso for inevitável...), no seu negócio, é legal pensar o que você quer para a sua vida e inserir o projeto profissional nesse bolo. O que dará sentido ao seu dia-a-dia? O que lhe deixará mais feliz, mais motivado, mais apaixonado pela vida?

Uma carreira na assessoria de comunicação de um órgão de governo? A montagem de uma micro-empresa na área de assessoria de imprensa (em um país aonde o ambiente de negócios não é muito estimulante para isso)? Uma rotina de repórter e de editor de alguma jornal, revista ou site? Ter uma carreira “exitosa” na área de comunicação interna de uma mega multinacional? Ser um apresentador de TV ou trabalhar nos bastidores, como editor ou produtor? Produzir programas bem "descolados" para a nova IPTV sobre os melhores albergues do mundo (alguém aí pode me oferecer esse emprego?)

Tenho um amigo que largou um “ótimo” salário em uma multinacional do petróleo e, depois de fazer vários cursos sérios, se tornou instrutor de asa deltas. Hoje ele está morando nos EUA onde abriu uma empresa (lá é bem mais fácil fazer isso) na área pet (parece que é um hotel quatro estrelas para cachorros...), e pelo jeito está muito bem. De grana e de satisfação com o que faz.

Na academia, hoje de manhã, ouvi uma personal conversar com a sua aluna sobre algo como “o sonho de cada um”. Nem sei em que contexto aquilo foi dito, mas logo liguei a coisa à conversa de ontem com o meu amigo do aeroporto.

As relações de trabalho e as formas de se viver, de se relacionar e de fazer dinheiro estão mudando muito rapidamente nessa sociedade digital em que a gente está vivendo. Mas, independente disso, somos o mesmo ser humano do tempo das cavernas, com os seus dilemas, conflitos, dúvidas, medos, projetos e sonhos. E vivemos em grupos, em sociedade. O que vai fazer com que a sua vida fique mais legal, ganhe mais sentido, o(a) motive e o(a) realize?

E mesmo que as velhas utopias socialistas não façam mais sucesso nem sentido (até porque seguir ideologias como religiões é muito complicado, aprisionante e emburrecedor), eu, particularmente, acho legal sonhar (ainda) com um Rio de Janeiro e com um Brasil e com um mundo em que a gente perceba o ser humano (sobretudo desde a infância) sendo mais valorizado e tendo mais oportunidades de ser um cidadão pleno e de viver dignamente. Este é só um dos meus sonhos...

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