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domingo, 10 de fevereiro de 2008

Entrevista com Carlos Parente

“Fofoca dentro das empresas é uma doença organizacional”

Dando continuidade à discussão sobre os estragos causados pela fofocagem nas empresas, resolvi entrevistar o Carlos Parente, autor do livro “Obrigado, Van Gogh!”, assunto de um dos últimos posts do Canal 17.com. Professor da ESPM-SP, escritor, articulista, com mais de 18 anos de experiência nas áreas de Comunicação, Recursos Humanos e Marketing, Parente aceitou de imediato o meu pedido e nos concedeu a seguinte entrevista:

Canal 17.com - Sabemos que fofocas são intrínsecas ao ser humano, independente do sexo (homens têm um jeito diferentes de falar dos outros, mas falam também). Nas melhores famílias e mesmo nas melhores empresas, a vida alheia, seja do colega, do desafeto ou dos gestores, é objeto de curiosidade e de comentários por parte das pessoas. Mas, em sua opinião, qual seria o limite entre a fofoca "inofensiva" e a fofoca "do mal", "destrutiva" e "prejudicial" dentro das empresas? E como agir quando estas são detectadas?

Carlos Parente - Fofoca dentro das empresas é uma doença organizacional. Portanto, não pode e nem deve ser positiva. É preciso um constante "dedo no pulso" no processo de gestão para detectar, ainda no início, as "fofocas". Gestores capacitados, mensagens claras, constantes e acima de tudo relevantes para o receptor são o melhor remédio!

Canal 17.com - Em um dos posts no blog, falo do caso de uma empresa que virou um "barril de pólvora", nas palavras de um dos gerentes, por conta das fofocas e do "climão" predominante. Em geral, quando a "situação" chega a esse ponto, o problema pode estar num "vazio comunicacional", numa lacuna de valores e mensagens, deixados pela comunicação interna, RH e pela gestão da empresa, que não estariam sabendo criar uma "liga" e quebrar os preconceitos e animosidades entre os setores? Pode denotar também um problema de liderança(s)?

Carlos Parente - Cuidado! Nessa hora, humildade é muito importante! A área de comunicação e/ou o RH não substituem o papel dos gestores! Estes sim têm a obrigação da boa gestão no dia-a-dia, da clareza na transmissão das mensagens e acima de tudo de cuidar do "clima" no próprio departamento. Nós, profissionais de comunicação, não podemos ser onipotentes e nem onipresentes. Há um limite para nossa atuação. Comunicação é um "processo" que muitas vezes se desenrola a milhas e milhas distantes do departamento de comunicação.

Canal 17.com - Você já vivenciou algum caso de fofocas ou de boataria que tenha desestabilizado a empresa em que trabalhava ou pelo menos criado um clima muito ruim?

Carlos Parente - Já! Certa ocasião, a empresa na qual trabalhava estava "estudando" o fechamento de algumas lojas em determinadas praças (questão de produtividade X custos; potencial de mercado etc). Os motivos eram mais do que justificáveis - empresarialmente falando. Mas, a notícia "vazou" sem o respectivo embasamento da decisão. Nessa hora, não adianta transformar uma má notícia em uma boa noticia e "dourar a pílula" - o processo desanda e compromete a credibilidade e entendimento. Portanto, o caminho adotado foi o da transparência da mensagem oficial (ainda que tardia) e muito corpo a corpo para administrar eventuais danos colaterais.

Canal 17.com - Primos diretos da velha fofoca S.A, os boatos também encontram, em algumas situações, terreno fértil para brotarem e se espalharem numa empresa. Levando em conta os seus mais de 18 anos de vida corporativa, que dica você poderia nos dar para evitar os boatos e para minimizar os seus feitos? Para você, eles são inevitáveis ou dependem muito das atitudes de respeito, confiança e transparência da empresa para com os seus colaboradores?

Carlos Parente - Só há oficina de boatos quando temos "ausência" do discurso oficial e gestores que não exercem na íntegra o seu papel de líderes de equipe. Quando não há uma cultura de comunicação instalada e valorizada. Dicas: comunicação boa é aquela que, além da clareza da mensagem, sai no tempo correto, antecipa dúvidas e esclarece posicionamentos. Portanto, um sistema contínuo de comunicação (intranet, e-mails, mural, boletins etc), muito estímulo para a comunicação gestor X equipe (face a face) e "valores organizacionais" que estimulem a transparência e o diálogo são fundamentais.

Canal 17.com - Mesmo com a mais avançada e azeitada estrutura de Comunicação Interna, mesmo se forem usadas adequadamente todas as ferramentas "Flinstones e Jetsons" (como você cita em seu novo livro) no processo de comunicação (diálogo) com os colaboradores, a velha rádio-corredor sempre vai existir. Você não acha que ela, a rádio-corredor, é um manancial importantíssimo de informações para os gestores, inclusive da área de comunicação, em termos de "feedback" para a empresa? Não seria um dos termômetros-chaves da "comunicação empresarial underground", que também deve ou deveria ser considerada?

Carlos Parente - Sim e não! Quando estamos com febre, podemos compreender que algo está errado com nosso organismo. Por outro lado, esse sintoma é ótimo, pois permite uma série de interpretações e análises de possíveis caminhos para uma cura. Há quem diga que ter febre é muito bom, afinal o organismo está reagindo blá, blá, blá. Por outro lado, é muito chato e até doloroso estar com febre. Analogamente, a rádio-corredor é também um dos sintomas que algo não vai bem na comunicação e na gestão. Nesse caso, o importante é um diagnóstico relativamente rápido (afinal, o "organismo organizacional" também é muito complexo - às vezes, as empresas possuem muitos funcionários em dezenas de endereços) e a certeza de que é preciso adotar um coquetel para endereçar o processo de cura: comunicação clara e constante, gestores treinados na competência "comunicação" para auxiliarem no processo, veículos internos ágeis a alinhados à cultura e, acima de tudo, coragem e disciplina para enfrentar situações complexas.

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